quinta-feira, 28 de maio de 2015

Constitucionalização da corrupção

Aconteceu! Na última quarta-feira, 27 de Maio, agentes do FBI entraram em um hotel na Suíça e prenderam 7 poderosos chefões da FIFA por corrupção (subornos e esquemas de propinas estavam em jogo). Não era o Matt Demon, nem o Bruce Willis, muito menos o Martin Lawrence vestido de vovózona na operação. Aconteceu de verdade! E dentre os figurões presos, estava o octogenário José Maria Marín, penúltimo presidente da CBF.

A ficha do senhor Marín é extensa, mas aqui vai algum aperitivo: além de dirigente da CBF, Marín governou São Paulo entre 1982 e 1983, sendo o penúltimo governador de SP do regime militar. Também foi deputado do partido da ditadura ARENA, onde protagonizou discursos inflamados contra a esquerda; o mais famoso deles foi publicado em 9 de outubro de 1975 no Diário Oficial do Estado de São Paulo. O texto criticava a ausência da TV Cultura na cobertura de eventos de seu partido e exigia uma providência para que a "tranquilidade" voltasse a reinar no Estado. 16 dias depois, o jornalista e diretor de jornalismo da TV Cultura, Vladimir Herzog, foi torturado até a morte.

Clap-Clap, FBI. E que as investigações escavem a vida de Ricardo Teixeira, Marco Polo Del Nero, João Havelange. Mexam também nas falcatruas de patrocinadores e de emissoras de televisão e averigue a porra toda para que quem dever possa pagar logo. 

Vale colocar algo sobre esse assunto entre parênteses (como que fica agora aquele ritual da família brasileira e do cidadão de bem em ir protestar contra a corrupção com a camisa da seleção brasileira?).


Trocando a pauta, mas ainda no campo da picaretagem: nem só de boas notícias é feita uma quarta-feira de Maio. Em mais um capítulo de House Of Cards Brasil, o nosso Frank Underwood brasileiro, Eduardo Cunha, mais uma vez agiu de modo duvidoso para legislar em causa própria.

Depois de uma baixa na noite de terça-feira, 27, Cunha “resetou o videogame” e conseguiu colocar em votação – novamente – a emenda que constitucionaliza a “doação” de empresas privadas para campanhas de partidos políticos. A emenda que não foi aprovada na terça dizia que as empresas poderiam doar para os candidatos dos partidos, e a que foi aprovada na quarta, só mudou para: “empresas podem doar somente para os partidos”. Se os partidos podem repassar a grana para os candidatos, deu na mesma. Ou pior, o retrocesso foi ainda maior. Antes, o processo de "doação" era mais transparente. Sabíamos para qual candidato iria o dinheiro de determinada empresa. Agora, os reais vão para a alta cúpula dos partidos que repassará aos candidatos: processo ainda mais obscuro.

Devo reconhecer que o Cunha é mesmo muito bom. O cara tem que ser muito sagaz para reverter em menos de 24 horas uma situação que já estava decidida. Às pressas, o texto foi aprovado por 330 votos a favor e 141 contra (Veja aqui qual foi o posicionamento do seu deputado). Além das manobras para essa votação, o presidente da Câmara ainda conseguiu posar com um discurso de: "estamos fazendo reforma política". Que reforma é essa que ao invés de melhorar, deixar mais transparente, faz totalmente o contrário?

Em resumo, PT, PDT, PCdoB e PPS foram os únicos 4 partidos que recomendaram voto contrário ao financiamento de campanha por empresas. Além do Psol, que tentou a obstrução da votação.

Vamos às análises. É claro que muitos parlamentares têm o interesse em constitucionalizar tal medida, eles já estão até com a alma do rabo presa com várias empresas privadas. (Mais claramente: muitos parlamentares já devem favores de campanha para os empresários). É uma via de mão dupla: eu, empresário, ajudo a financiar as campanhas do seu partido, você elege vereadores, prefeitos, governadores, deputados, senadores e presidente e depois devolve o favor facilitando uma licitação aqui e outra acolá. Equação simples.

Gostaria de ouvir as posições de você que me lê, mas me parece óbvio que os partidos que votaram a favor dessa emenda, de alguma forma, estão apoiando a corrupção. (Estou sendo eufêmico).

Ou você acha mesmo que o Sr. Odebrecht ou o Sr. Camargo Corrêa, com suas empresas com FINS LUCRATIVOS, vão chegar no PSouPTouPPouPMouPDouPVouPRouDEMalgumacoisa e dizer: "aqui está XX milhões de reais que eu estou doando para que vocês possam financiar suas campanhas eleitorais, porque eu simpatizo com a ideologia do seu partido, com certeza vocês são a melhor opção para o país."? Eu sei que você não acha isso, ninguém acha. O Sr. Odebrecht vai querer ganhar licitação para centenas de obras com cifras bilionárias, das quais ele vai superfaturar os seus bilhões - para embolsar uma parte - e injetar outra parte em outras campanhas do partido que o "ajudou" que, por sua vez, fará o famoso caixa 2. CORRUPÇÃO, caros. E com dinheiro PÚBLICO.

O que foi votado, amigos, é a constitucionalização da corrupção. Não há outra forma mais amena de eu chamar o que aconteceu. Agora eu pergunto: cadê a repercussão disso na mídia? Cadê a população protestando contra isso? Cadê os panelaços? Cadê as marchas? Cadê os patriotas de camisas amarelas nas ruas? Pelo jeito, vamos ter que aguardar o Bruce Willis se juntar com o Morgan Freeman para vir nos salvar.      

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Ganhador do Oscar, de melhor, ator coadjuvante e não sabe usar vírgulas nem ponto de interrogação?